Às vezes penso que estou a ficar louco, daqueles loucos que não se apercebe que está sempre a dizer a mesma palavra, a mesma frase, a viver o mesmo momento a toda a hora, como se nunca tivesse havido momento mais digno de viver.
Sinto uma repetição estranha de pedaços perdidos no tempo, que se reajustam de novas e mais rebuscadas maneiras, provocando uma sensação eterna de dejá-vu.
Estou a passar tempo na mesma sala de espera, para ver a mesma pessoa, no mesmo piso, tantos anos depois. Estou a reviver cada pormenor, de maneiras diferentes, desordenadas, a fraqueza entre pontos de força, quando antes uma tinha dado lugar à outra sem que se olhasse para trás.
O corredor é o mesmo, de um verde-claro derrotista e um branco que impede o descontrolo e a raiva. A pedra provoca o sapato, luta com ele, e ouve-se um som seco de cada vez que se encontram.
Momentos mais tarde, concluo que ainda não foi desta, e sigo o caminho para casa descendo o mesmo passeio rodeado de árvores e de bancos, como se de um parque se tratasse. O parque mais sádico, onde as crianças perdidas brincam sem o saber, à espera que alguém diga que é hora de ir para casa.
Já fora daquele sítio, há outros pequenos detalhes que renovam essa suspeita. Quer seja a mesma pessoa que vemos há tantos anos fazer exactamente a mesma coisa à mesma hora, ou pequenas conversas que partilhamos sobre o mesmo assunto há tanto tempo com a mesma pessoa.
A loucura está nos pormenores, na repetição, na mecanização de tudo o que se conhece, todos os gestos. E é por isso que nunca se tem a noção de que se enlouquece. Na nossa mente, tudo é igual, fazemos tudo igual, mas à nossa volta todos sabem que somos loucos porque agimos dessa maneira. A linha é ténue, entre a loucura e a monotonia. A repetição excessiva só o é porque são outros a dizê-lo.
E tornamo-nos loucos porque reparam nisso. Nesse excesso de pormenores que já há muito deixaram de ser detalhes.
Enquanto escrevo, sinto-me louco. Porque reparar nisto é loucura.
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